segunda-feira, 9 de maio de 2016

Agora calo-me

Agora calo-me.
Calo-me em som somente,
Pois percebo que surdamente
Tens te encontrado comigo .

E agora o meu grito é todo
Palavra muda, que à tudo exala.
Para que todos do mundo
Sinta o que se cala mas fala.

Destemido vou prudente
Pois, de sofrido, já fui vivente.
E hoje, simples, estou contente
De morrer à quem mata a gente.

Do amor: plantei aos montes
Calados entre as cidades.
Visto que vivo a tentar conhecer
Da morte, a bordar verdade.

Dou ao gozo mórbido que vos atrai
Meu desprezo vivo e feliz.
Pois gozo em amor que não cai
E só dou asas à sonhos que fiz.

Da sequidão que sentia
Passei de sentir para ver e provar.
O gosto era amargo e ardia
A cada hora que eu começava a amar.

Mas leia muito bem à isto:
Comerei a cada grão deste prato.
Comerei a cada grão, ainda que farto
Esteja eu destes petiscos.

E obrarei todo endiabrado dia.
E daquelas granuladas fezes
Escreverei minhas poesias
Anulando às tuas teses.

Obrarei à cada grão que comerei
Sentado em meu trono de rei
A escrever minhas tantas poesias
E a esbanjar em gozadas ironias.

E de cada grão um degrau faço
E, calmamente, dou meus passos.
E há de ler este poema curioso de mim
Mas não se preocupe, já te traço: é teu fim.

O meu silêncio então grita
Apesar de mim, pois a palavra é viva
E se desloca muda ao surdo
A expor-lhe o vero do que há em tudo.

Fernando Faramíglio

quarta-feira, 27 de abril de 2016



-- Eles se foram.
-- Quem ? Como assim ?
-- Eles se foram, Hortência, nos deixaram aqui.
-- Eles quem ?
-- Os nossos sonhos. Eles entraram em transe, fugiram de mim, fugiram de você, acho que são eles que fazem a vida ficar assim.
-- Assim como ?
-- Assim como não sei... um mal-estar de leve, um bem-estar que machuca. Nossos sonhos foram jogados nas estrelas, eles nos obrigam a brilhar mesmo estando à anos luz deles.
-- Eu não sei o que te dizer, Fernando, apenas viva com cautela.
-- Você é uma psicanalista, você deveria me dizer algo mais.
-- Os nossos sonhos são feitos pra gente ter rumo na vida. Digo, alguns deles. Outros são feitos pra gente jogar nas estrelas mesmo. Basta saber qual deles você vai viver, e qual deles vai virar soneca. – Respondeu Hortência com uma certa aflição, titubeando a fala.
-- Não sei, todos os médicos em que eu passo me dizem a mesma coisa. Todas as pessoas me dizem a mesma coisa. E tudo que elas estão dizendo me soa como um nada. – suspirou Fernando.
Enquanto Hortência pensava o que responderia ao seu paciente caótico, Fernando tentava segurar as memórias de sua vida que lhe ocorriam na cabeça. Perdido no que inventou, escreveu, manipulou, e o que realmente viveu, quebrou o silêncio com sua voz trêmula:
-- Acho que eu nunca saberei quem eu sou, ou quem as pessoas são...
-- Mas isto realmente não é nosso dever.
-- E qual seria o meu dever? -  extravasou.
-- Você está muito agitado, quer beber uma água?
-- Mais esta! Estou bem. – Respondeu acamando-se. É que as vezes...
-- As vezes o que?
-- As vezes eu sinto que a morte é a única resposta.
-- Não diga isto Fernando, não vá...
-- Não, não vou tentar tirar a minha vida. – cortando a fala de Hortência prosseguiu Fernando – Eu cansei disso tudo. Quanto falta pra terminar?
-- A consulta ?
-- Sim.
-- Vinte minutos. Mas você pode terminar a consulta quando se sentir a vontade.
-- Se eu não fosse obrigado eu nem teria vindo. Então vou ficar.
Não ficaram nem cinco minutos em silêncio e a voz de Hortência ecoou no consultório, cortando o silêncio:
-- Você não me disse como anda os seus livros, suas poesias.
-- Estou escrevendo muito pouco ultimamente.
-- Pouco? Pensei que tinha comprado uma máquina de escrever, justamente pra escrever mais...
-- Não.
10 minutos de silêncio que pareceram 10 segundos.
-- Deu a hora, Fernando, obrigada pela consulta. Hoje conservamos, pelo menos.
-- Não agradeça.
Levantou-se Fernando do divan, aparentemente desconfortável. Dirigiu-se à porta e saiu despejando suas dúvidas pelos concretos dos prédios nas ruas, indagou ser alguém ao sentir o cheiro das poucas árvores. Viu que não adiantara muita coisa a consulta, mas a vida continua. Seus anseios e suas angústias estarão sempre presentes tal como alegrias e contentamentos. Ele nunca se sentira tão vivo como agora, somente por andar na rua.

terça-feira, 19 de abril de 2016

Eu morri.
num dia quente em que a terra me ouvia,
descobri que não estava morta, eu só dormia.
Eu morri
mas percebi que a estrela
ainda que morta ainda brilha.
Na verdade...
Eu nasci
pois aprendi que minha sina
era reescrever cada verso
de minhas velhas poesias.

- GP


Sonhar sempre foi fácil
Eu acredito
Eu posso
Eu consigo
Dentro de mim sempre há um abrigo.
Mas ainda assim quero tanto,
sonhar este teu sonho
entrar neste teu mundo
conhecer as naves
navegar no mar
entra nessa cidade
que acabou de se inventar.
Surpreenda-me vida
a artéria corrompida é uma viagem
a overdose é uma viagem
o amor é uma viagem
o hospital é uma viagem
de quem precisa se tratar.
Já viajei demais.
Mas, veja bem,
a melhor viagem que tive
foi de arrumar as malas,
viver um sonho em família
sentir tudo no compasso
novos ares, velho espaço.
Ver na janelinha do avião,
do carro, monorail, taxi
a paisagem presenteada
além dos céus e mares.

- GSP



Não estou morta
Nunca estarei morta
Não posso querer estar morta.
Isso tudo é uma mentira
ainda que eu negue estar viva
os santos me darão uma estrela
pra por no meu peito.
Quem foi aquele homem eleito
que tirou a vida de tanta gente?
"Que mentiu mas fez
que cheirou cocaine"
Por favor, isso tudo é mentira.
Perceba a escola em que você está presente
se está lendo isto, parabéns,
veja que a vida é comumente.
E como mentem, vou te dizer.
Mesmo que não queira, você vai viver.
Agora, como diria Bethânia,
Agora é brincar de viver.

- GSP


Calou
O instante, a conversa, o debate
Na retina: o universo, as coisas
Inerentes.
O amor errante consola
A vida fugitiva
Vai cambaleando entre os becos das minhas ruas
Sou verdade
Nua
Crua.
No meu peito carrego a dor
Do instante partido ao meio
Entre o que restou
E o que veio.
Não vou lamentar
Ou assumir outra mentira
Pintei minha vida em sua parede
Mostrei tudo o que passei
Como não tive deleite
Pois assim não me deletei.

- GSP


As crises transmitem audiência
na TV o orgulho do povo em decadência
uma população que teme ser brasileira
e esquece a pátria herdeira dos índios,
sertanejos, escravos, guerrilheiros
e esquece dos açudes, do grito derradeiro
da mula o trote a liberdade,
da cara pintada, da mulher retalhada
da princesa inconformada.

Onde está o orgulho nacional?
Onde está o amor à pátria?
As nossas águas estão sujas num lamaçal.
quem vai plantar a horta neste quintal ?

A revolução será a união entre as partes
um povo caminhando junto pela liberdade
que tomemos a França como exemplo
que tomemos o Chile como exemplo
o bem em comum deve ser o centro.


segunda-feira, 28 de março de 2016

Poema das Leis (físicas)


Um corpo em movimento
É sempre um corpo em movimento.
Porém um corpo inerente
É sempre imbatível
estático
permanente.
Não contradiga minha inércia
Eu sou mesmo inerente
Já não sinto o presente
Não há o que me movimente.

A minha força é resultante
Da quantidade da massa
Que eu trago no meu ser:
Leve, viva, incessante
Minha força é impulsionada
Por minha vontade de viver.

Logo, por assim dizer,
Saiba, a tua ação não é alheia
Na tua mão
a dor que produz a alguém
Reagira a ti mesmo
Num eterno vai vem.

  
Gabrielle Portella

domingo, 27 de março de 2016

A transa é uma disputa
que no final a mulher
é sempre tida como puta.

Sentir: é possessão.
Se sentir: faça com a mão.
Na cama ninguém tem razão.
Quem sente é quem se permite
a fantasia e a ilusão.

Estou traficando sentimentos
que entorpecem a razão:
ninguém mais quer ter vazão,
ninguém mais quer a verdade.
Num mundo cheio de vaidades
de gravidade vai ao chão.

- Gabrielle Portella


domingo, 20 de março de 2016

Eu não queria questionar esse teu jeito



Eu não queria questionar esse teu jeito
eu não queria me questionar.
Foi uma vida por assim viver:
Me esforçando sempre pra ser a melhor
Pra ser a melhor pra você.
Eu te dava tudo, você me cobrava
Se qualquer outra pessoa assim fizesse
Eu me doía, eu me importava:
Ninguém pode me tratar assim.
Mas você...
Você trazia o sustento
Você se dedicava aos nossos filhos
Você me dava um acalento
E ainda que por um só momento
eu me sentia amada.
E neste vago sentimento
Eu sustentava o meu orgulho,
O meu argumento de alegria
Pra eu dizer aos outros
Que toda a minha vida
Tinha sido preenchida
Pra eu dizer a mim mesma
E me provar todo os dias
Que eu não vivi uma fantasia.

Mas o tempo foi secando
O que antes transbordava
Todo aquele seu discurso
De amor pra eternidade
Foi ficando no passado
E quando eu fui me dar conta
A gente já nem conversava.
E aquela sensação de ser amada
Não preenchia mais a lacuna .
A ferida aberta agora sangrava.
...
E agora eu sei
A dor me fez chorar
Mas também me fez perceber
Que o que sofri por te deixar
Não se compara ao que você me fez sofrer.


Gabrielle Portella

Contentes Frustrações

Q UERO CAMINHAR EM MEIO  À MULTIDÃO DIZENDO O QUANTO SOU FELIZ NO AMOR QUE TENHO SOFRENDO E MESMO EM VÃO SABENDO QUE NÃO ME QUER A BORRECEND...